A CIRM é dirigida pela Marinha e coordena pesquisas e ações que impulsionam benefícios sociais e econômicos para o País
Praticamente todas as nações prósperas e livres dependem ou já dependeram do Mar. As águas navegáveis são fonte inesgotável de oportunidades e representam, sobretudo, instrumento de poder e desenvolvimento entre Estados. Mas até onde vai o mar de um País como o Brasil? E como mensurar os limites do território para além da faixa terrestre?
Antigamente, o mar territorial de um país era restrito a três milhas náuticas, mas o avanço tecnológico e os interesses estratégicos fomentaram a expansão das fronteiras marítimas. Para se ter uma ideia, em 1970 o Brasil estendeu unilateralmente seu mar territorial para 200 milhas náuticas, com propósito de proteger os interesses nacionais nas áreas marítimas pertencentes ao Estado.
Amparado por um Poder Naval robusto, tal movimento, embora desafiador às potências mundiais, assegurou ao País protagonismo no Atlântico Sul. Em 1973, a convocação da Terceira Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar congregou mais de uma centena de países em processo de deliberação, que se estendeu por quase uma década. Ciente das necessidades, o Brasil instituiu a Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (CIRM), importante colegiado multidisciplinar e colaborativo, responsável pela elaboração da Política Nacional para os Recursos do Mar.
Nesta quinta-feira (12), a CIRM completou 50 anos, contribuindo para, entre outros, a aprovação da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, em 1982, que foi a mais abrangente da história da ONU, com impacto direto nas dimensões das Águas Jurisdicionais Brasileiras. Esse documento legitimou os direitos sobre o espaço previamente estabelecido pelo Estado, formalizado sob a denominação de Zona Econômica Exclusiva (ZEE).
Há 50 anos, portanto, a CIRM coordena ações relativas à Política Nacional para os Recursos do Mar (PNRM), implementa o Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR) e exerce competências previstas na lei que instituiu o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC) como parte integrante da PNRM e da Política Nacional do Meio Ambiente.
Sessão Solene
A Secretaria da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (SECIRM) realizou uma Sessão Solene Extraordinária que marcou o jubileu de ouro da instituição, com a presença de representantes dos 18 ministérios que a compõem a CIRM. Além da leitura da Ordem do Dia do Comandante da Marinha do Brasil, Almirante de Esquadra Marcos Sampaio Olsen, houve o lançamento de um selo comemorativo dos Correios em homenagem à CIRM, com respectiva obliteração deste selo. O ato de obliterar o selo o torna uma peça única e confere-lhe um valor simbólico e histórico.
Também foi lançada pela Casa da Moeda do Brasil uma medalha comemorativa que apresenta uma releitura da marca comemorativa dos 50 Anos da CIRM, além de representações de mapas geográficos que ilustram a atuação da CIRM na ampliação da Amazônia Azul, com a extensão da Plataforma Continental, além de parte da Antártica, contendo a Bandeira Nacional, marcando a relevante presença brasileira no continente gelado. Após o lançamento, foi conduzida uma cerimônia de descaracterização do par de cunhos originais da medalha.
Simbolizando a histórica parceria que transformou o PROANTAR no mais longevo Programa de Pesquisa do País, o colegiado realizou o descerramento de uma placa comemorativa. Por fim, foi lançada pela SECIRM, a 2ª edição de 2024 do INFOCIRM, informativo no qual são exaltados os 50 anos de atuação da Comissão.
PROANTAR
Ciente valor geoestratégico do Continente Antártico, o Brasil aderiu ao Tratado da Antártica em 1975. Naquela circunstância, a CIRM teve a responsabilidade de implementar o Programa Antártico Brasileiro (PROANTAR), o mais longevo programa de pesquisas científicas do País. Na esteira desses acontecimentos, a MB incorporou o Navio de Apoio Oceanográfico “Barão de Teffé” à sua Esquadra e iniciou a primeira Operação Antártica, o que resultou na elevação do Brasil à condição de membro consultivo do Tratado, em setembro de 1983. O intricado desafio de conceber, construir e operar uma Estação Científica foi superado em 1984, com a inauguração da Estação Antártica Comandante Ferraz. Em reconhecimento à excelência das pesquisas conduzidas, o Brasil ascendeu ao status de membro do Comitê Científico de Pesquisas Antárticas.
Em dezembro de 1981, foi aprovado o Primeiro Plano Setorial para os Recursos do Mar (I PSRM). Nas palavras do experimentado “Marinheiro” e idealizador do PROANTAR, Almirante Maximiano Eduardo da Silva Fonseca, o I PSRM “representa um significativo impulso na nossa grande e inadiável singradura (do Brasil) para o Leste, nesse instante histórico que a humanidade reivindica diariamente prerrogativas e direitos sobre os oceanos”.
Desde a sua implantação, o PROANTAR tem acolhido mais de 3.700 pesquisadores das mais diversas áreas do conhecimento. Para tal, conta com o Navio Polar “Almirante Maximiano” e o Navio de Apoio Oceanográfico “Ary Rongel”, e aeronaves UH-17 embarcadas. Ainda nessa proa, o Navio de Apoio Antártico “Almirante Saldanha” será, a partir de 2025, o primeiro Navio Polar construído no Brasil a ser integrado às desafiadoras missões antárticas. Em fase de construção no Estaleiro Jurong Aracruz, no Espírito Santo, o novo meio de superfície ampliará a área de atuação do PROANTAR e imprimirá agilidade sem precedentes às operações.
Além disso, o projeto revela-se verdadeiro catalisador para a economia nacional, promovendo a geração de 600 empregos diretos e 6 mil indiretos, propiciando benefícios tangíveis à sociedade brasileira.
LEPLAC
Como resultado do comprometimento da CIRM, o Brasil implementou o Plano de Levantamento da Plataforma Continental Brasileira (LEPLAC), em 1989. Este é um projeto de Estado, com a finalidade de determinar a extensão oceânica para além das 200 milhas náuticas, na qual o País exercerá os direitos de soberania para exploração e aproveitamento dos recursos naturais do leito e subsolo marinhos.
Ao longo de 15 anos de pesquisas, monitoramento e meticuloso levantamento de dados, à luz das diretrizes estabelecidas pelo LEPLAC e da mobilização de cientistas de centros de pesquisa, da Petrobras, do Ministério das Relações Exteriores e dos navios da Diretoria de Hidrografia e Navegação, o Brasil apresentou, em 2004, o pleito de extensão da Plataforma Continental perante a ONU. Na ocasião, o País se posicionou como a segunda Nação a reivindicar a ampliação de suas Águas Jurisdicionais. Oportunidade para um Estado costeiro expandir o território marítimo de forma integralmente pacífica.
Nesse contexto, destaca-se a desmedida contribuição dos “Bandeirantes das Longitudes Salgadas” na consolidação da fronteira leste, que permitiu a ampliação da área marítima brasileira de 3,6 para 5,7 milhões de km²; incremento de quase 60% da extensão original, região rica em recursos naturais vivos e não vivos, a “Amazônia Azul”.
Amazônia Azul
O termo Amazônia Azul foi cunhado pela Marinha do Brasil em 2004, para despertar na opinião pública a noção da importância das áreas marítimas sob jurisdição brasileira, tão vastas, ricas em biodiversidade e recursos naturais, com tanta importância ambiental e tão vulneráveis quanto a floresta Amazônica, a “Amazônia Verde”, cuja importância já era bem reconhecida pela sociedade.
Busca-se, com isso, a valorização, preservação, uso sustentável e a proteção das Águas Jurisdicionais Brasileiras, que compreendem cerca de 5,7 milhões de km², onde são produzidos mais de 95% do petróleo nacional, 85% do gás natural e trafegam 95% do comércio exterior. Onde, portanto, mais de 20 milhões de empregos se sustentam.
O Brasil, hoje, soma 81 milhões de empregados formais e informais (dados do Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – CAGED), ligados ao mar, ou seja, um em cada quatro brasileiros empregados atuam em negócios relacionados ao mar ou ao comércio marítimo. Isso significa que a Amazônia Azul é um importante pilar da economia brasileira.
Segundo a Diretoria-Geral de Navegação (DGN) da Marinha do Brasil, a atual contribuição do oceano para a economia nacional já tem um valor agregado de mais de R$ 1,74 trilhão.
Mapa atualizado
Em consequência do trabalho iniciado há 34 anos no âmbito do LEPLAC, a área da Amazônia Azul foi incluída no mapa político brasileiro. O processo de atualização da Carta é fruto de um estudo iniciado há quatro anos com a Marinha, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Ministério da Educação (MEC), com o objetivo de modificar a percepção de estudantes, profissionais e da sociedade em geral sobre os contornos da vastidão marítima brasileira.
“Desde 2019, na CIRM, estamos em tratativas com o MEC e conseguimos, ao longo desse processo, atualizar o Plano Nacional do Livro Didático do Ensino Médio. Então, a partir de 2023, nos livros de geografia, já trazemos para os bancos escolares a representação do verdadeiro Brasil: o Brasil Terra e o Brasil Mar. E, junto ao IBGE, desde 2019, temos essas tratativas, e, muito em breve, teremos um novo Atlas Geográfico Brasileiro, representando esse Brasil de 14,2 milhões km²”, adiantou o Subsecretário da CIRM, Capitão de Mar e Guerra Rodrigo Carvalho.
São Pedro e São Paulo
Desde 1998, a Marinha do Brasil mantém uma estação científica no Arquipélago de São Pedro e São Paulo (ASPSP), onde apoia pesquisas em um conjunto de ilhas situado a 1.100 km de Natal (RN). Por estar localizada na faixa equatorial, a região desperta grande interesse da ciência, além de possuir uma formação geológica peculiar. Com origem na zona da fratura de São Paulo, essas ilhas oceânicas brasileiras são constituídas por rochas do manto da Terra, fato extremamente raro, em que o conjunto de montanhas se ergue do fundo do oceano de 4 mil metros de profundidade, até aparecer acima da superfície do mar.
Mais de dois mil cientistas, vinculados a universidades de todo País, já desenvolveram estudos de graduação e pós-graduação, nessas quase três décadas desde a instalação da primeira estação científica no ASPSP.
Em relação à soberania, a ocupação permanente e a localização geográfica garantem a ampliação da Zona Econômica Exclusiva em uma área marítima circular, com raio de 200 milhas náuticas ao redor do arquipélago, cuja dimensão é maior que as áreas dos estados de São Paulo e Paraná juntos, onde o Brasil tem exclusividade no uso dos recursos do mar.
Arquipélago de São Pedro e São Paulo, com estratégica localização, que permite incorporar ao Brasil uma área de mais de 450 mil quilômetros quadrados – Imagem: SECIRM
Ilha da Trindade
As Pesquisas Científicas na Ilha da Trindade (PROTRINDADE) estão completando 17 anos e são fundamentais para ampliar o acesso, a gestão e o desenvolvimento das investigações científicas nas ilhas da Trindade, Martin Vaz e na área marítima adjacente. Em resposta ao crescente interesse da comunidade científica, foi criada, em 2007, no âmbito do PSRM, a Ação PROTRINDADE, que tem como propósito promover e coordenar os estudos científicos, provendo a complexa logística de transporte dos pesquisadores, a manutenção da estação científica, para apoio das atividades de campo, a aquisição e a disseminação dos resultados das pesquisas sobre essa região singular.
A ilha da Trindade está situada a cerca de 1.140 km de Vitória (ES) e a 2.400 km da costa ocidental da África, formando com Martin Vaz o arquipélago no extremo Leste da Amazônia Azul.
A construção da Estação Científica da Ilha da Trindade (ECIT), em 2010, proporcionou instalações para os pesquisadores, que puderam expandir suas atividades nas ilhas e nas águas circundantes. Desde então, foram realizadas 130 expedições científicas, com a participação de cerca de 1.600 pesquisadores, que realizaram estudos vinculados a distintas universidades e instituições científicas do País.
Protegendo nossas riquezas
Considerando-se que as fronteiras marítimas não dispõem de marcos físicos que as delimitem, a Marinha do Brasil emprega diariamente seus navios em missões de patrulha naval por diversos pontos da costa brasileira, contribuindo para a segurança do tráfego marítimo e para a defesa dos interesses estratégicos do País na Amazônia Azul, coibindo atividades ilícitas e não autorizadas nas Águas Jurisdicionais Brasileiras, como foi o caso de um navio de pesquisa de bandeira alemã, interceptado pela Fragata “Independência”, coletando amostras do subsolo marinho na região da Elevação de Rio Grande (RS), área de exploração exclusiva do Brasil, conforme o Direito Internacional Marítimo.
Outra frente de proteção da Amazônia Azul está na preparação do Poder Naval, nucleado na Esquadra Brasileira, para atuar contra forças adversas que utilizem o mar para atentar contra a soberania da Nação. Navios, submarinos, aeronaves e tropas de Fuzileiros Navais preparados e prontos para realizar ações de guerra naval são o principal fator para a dissuasão contra ameaças de maior vulto à segurança e aos interesses do País, que se configurem no mar ou a partir do mar.
As informações são da Agência Marinha de Notícias.