Por Marcos Degaut*
Não restam dúvidas de que a indústria de defesa contribui para o desenvolvimento econômico de qualquer país, oferecendo desdobramentos positivos para toda a sociedade, na medida que gera empregos de alta qualificação e renda, contribui para o aumento das exportações, atrai investimentos, agrega valor a produtos e serviços e tem o maior potencial de indução de ganhos e saltos tecnológicos, além de se traduzir em plataforma eficiente de projeção de poder e de ação política externa.
Efetivamente, em todos os países desenvolvidos e em grande parte dos que estão em desenvolvimento, uma economia de defesa robusta, diversificada, dinâmica, inovadora, autossustentável e que se oriente permanentemente no sentido da busca da autonomia tecnológica assume o caráter de componente fundamental de qualquer política pública voltada para esse segmento.
É essa indústria que proporciona, em grande parte, os meios para se preservar e aprimorar as capacidades necessárias à prontidão e ao emprego do aparato militar, de forma a assegurar a integridade do território, do patrimônio, dos recursos naturais, da população, das infraestruturas críticas e das instituições nacionais, bem como a salvaguarda de nossa soberania e de nossos interesses e objetivos estratégicos e os direitos inerentes ao pleno gozo das liberdades individuais.
Em defesa, não há espaço para improviso. Baseada na constatação de que não se pode ser pacífico sem ser forte, a permanente capacitação da indústria nacional deve figurar como um dos pilares centrais das políticas e estratégias nacionais de defesa do Brasil. De se notar, aliás, que o fomento à indústria de defesa representa um dos eixos centrais de atuação da política externa dos países desenvolvidos.
Plenamente ciente da centralidade do tema, o governo do Presidente Jair Bolsonaro, por intermédio da Secretaria de Produtos de Defesa do Ministério da Defesa (SEPROD), formulou, nos últimos quatro anos, marcos referenciais e iniciativas de cunho estratégico no tocante à políticas efetivas voltadas para o desenvolvimento permanente da nossa BID, para que esta possa atender às necessidades permanentes de preparo, prontidão, aparelhamento e modernização de nossas Forças Armadas, a fim de que estas disponham dos instrumentos necessários para o cumprimento de suas missões precípuas.
Neste sentido, a SEPROD elaborou e implementou um plano de ações estratégicas estruturado em quatro eixos (político-estratégico, econômico-comercial, sociopolítico e tecnológico), visando derrubar barreiras, eliminar gargalos à competitividade, promover ajustes normativos e inovar em soluções que pudessem desenvolver e ampliar a BID, com resultados amplamente positivos.
Atualmente, a BID nacional é composta por mais de 1.140 empresas, sendo 151 credenciadas como Empresas Estratégicas de Defesa (EEDs), com participação crescente no PIB do Brasil, alcançando 4,78% em 2021 (o equivalente a cerca de R$ 382,8 bilhões); e gerando 2,9 milhões de empregos.
Nesse cenário, merecem relevo os sucessivos recordes de exportações do último triênio. Em 2021, não obstante aos efeitos da pandemia, alcançou-se a cifra recorde de US$ 1,7 bilhão, representando acréscimo de 87,2% em relação a 2018.
No âmbito da promoção comercial, e com o objetivo de estabelecer cooperação técnica, potencializar a inserção de empresas no mercador internacional, incentivar o financiamento em projetos de P&D, constituir fundos de investimentos e atrair investimentos estrangeiros para o desenvolvimento e sustentabilidade da BID, foram promovidas diversas iniciativas e celebrados instrumentos internacionais de cooperação que trazem novos horizontes para nossa BID, com destaques para:
- a) Assinatura de 12 Instrumentos de Cooperação Internacional (MoU, Carta de Intenção e Acordos) com países parceiros – Arábia Saudita, Argentina, Reino Unido, Catar, Turquia, Ucrânia, Itália, EAU, EUA, Chile), dentre os quais o Acordo de Pesquisa, Desenvolvimento, Teste e Avaliação (RDT&E) firmado entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América;
- b) Realizados 12 Diálogos da Indústria de Defesa (DID) com parceiros internacionais (Reino Unido, Turquia, República Tcheca, EUA, Espanha, Ucrânia, Portugal, Israel, Índia, Egito, África do Sul e Coreia do Sul);
- c) Promovidas 10 missões técnicas no Brasil com nações-amigas (Turquia, Arábia Saudita, Catar, Egito, EAU, Argentina, Rússia, Japão, Malásia, Ucrânia); e
- d) Prestado apoio a seis eventos nacionais de grande porte (LAAD, EXPO Defense, Amazon Securitye Defense, CSTM, 6ª Mostra BID-Brasil)
De outra perspectiva, com o objetivo de mapear os gargalos sobre a produtividade da economia nacional de defesa e buscar novos caminhos para a resolução de questões que afetem a competitividade da indústria, observando as melhores práticas de política industrial internacional e a necessidade de desburocratização do aparato público e de redução dos custos de transações e de produção, foram realizadas as seguintes ações, dentre muitas outras:
- a) Pactuada com o Conselho Nacional de Política Fazendária a prorrogação da redução da base de cálculo do ICMS que impulsiona os setores aeronáutico/ aeroespacial e de veículos operacionais militares;
- b) Apoio para a promulgação da Convenção entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Emirados Árabes Unidos, visando a eliminação de dupla tributação, prevenção de evasão e elisão fiscais;
- c) Atuação no âmbito da Câmara do Comércio Exterior – CAMEX e seus comitês constitutivos com alguns dos seguintes resultados:
– Aprovação de operações de Seguro de Crédito à Exportação para o setor de defesa no valor de US$ 3 bilhões.
– Diminuição do imposto de importação para revólveres e pistolas de 20% para 0%.
– Aprovação das operações de PROEX Equalização para empresas do setor no valor de US$ 2,5 bilhões.
– Redução a 0% a alíquota do imposto de importação incidentes sobre insumos utilizados na fabricação de aeronaves.
– Redução linear em 10% da alíquota do Imposto de Importação estabelecida na Tarifa Externa Comum para todos os produtos, incluindo os do setor de defesa.
– Revogação do imposto de exportação de armas e munições brasileiras que são negociadas com a América do Sul e a América Central, incluindo o Caribe.
No âmbito da inovação tecnológica e no intuito de viabilizar recursos para o desenvolvimento de projetos de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) das Forças Armadas, diversas conquistas foram obtidas, dentre as quais:
- a) Celebrados 13 Instrumentos de Cooperação Técnica com órgãos públicos e privados (CNI, EMABRAPII, FIEB, FIEMG, FIERGS, FIESC, FINATEC, FIRJAN, IN-METRO, MCTIC, Parque Tecnológico de São José dos Campos e SENAI-RJ/RS).
- b) Aprovação de 51 projetos voltados para o desenvolvimento de CT&I da Defesa, no valor de R$ 1,2 bilhão do Fundo Nacional de Desenvolvimento Cientifico e Tecnológico.
- c) Firmada parceria com União Europeia (2020/2021) para concessão de subvenção econômica em projetos de inovação desenvolvidos por meio do Programa Horizon (2020) no valor de 300 mil euros.
- d) Apoio na celebração da parceria BNDES e a Embrapii, que destinou R$ 20 milhões em projetos de PD&I nos Institutos de Tecnologia (ICTs) em parceria com empresas.
Evidentemente, tais conquistas e iniciativas necessitam de uma base sólida para prosperarem e adquirirem sustentabilidade. Buscou-se, dessa forma, promover o permanente robustecimento da BID e contribuir para assegurar a capacidade operacional das Forças Armadas, sem aumento orçamentário. Dentro dessa perspectiva, alguns dos expressivos resultados obtidos foram:
- a) Realização de 11 reuniões da Comissão Mista da Indústria de Defesa (CMID), que deliberaram sobre a classificação de produtos e o credenciamento de empresas do setor de Defesa. Em relação a 2018, apresentou-se crescimento de 150% na classificação dos Produtos de Defesa; 41% no credenciamento de Empresas de Defesas e Empresas Estratégicas de Defesa; 81% na habilitação de empresas ao Regime Especial de Tributação para Indústria de Defesa (RE¬TID); e 380% nas empresas que o usufruem.
- b) Utilização do RETID pelas empresas credenciadas no MD; resultou em uma economia superior a R$ 120 milhões nos contratos executados de 2014 a 2021, sendo que mais de 70% do total no período 2018-2021.
Da mesma forma, buscou-se implementar soluções financeiras criativas e adequadas às necessidades do setor de defesa, como:
- a) Lançamento da primeira FINTECH de defesa do mundo, com perfil tecnológico, fruto do Acordo de Cooperação Técnica celebrado entre a SEPROD e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP).
- b) Assinatura do Protocolo de Intenções com a Câmara de Comércio Brasileira na Suécia (Brazilcham Sweden) para o desenvolvimento de ações conjuntas nos campos de financiamentos, investimentos, seguros, garantias e promoção comercial.
- c) Estabelecimento de parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) visando a criação e customização de instrumentos financeiros adequados e efetivos à BID.
A fim de se criar um ambiente regulatório propício ao fortalecimento do setor, a SEPROD promoveu revisão sistemática de mais de 25 atos normativos de interesse da Defesa. Com isso, buscou-se proporcionar a segurança jurídica necessária à condução das políticas voltadas ao fomento e desenvolvimento da BID, além de racionalizar a produção normativa, destacando-se:
– PORTARIA SEPROD/SG Nº 5216/2021, que atualiza a lista de produtos de defesa (LIPRODE) sujeitos ao tratamento administrativo no comércio exterior pelo ministério da defesa.
– PORTARIA GM-MD Nº 4.070, DE 5 DE OUTUBRO DE 2021, que aprova a Diretriz de Obtenção Conjunta de Produtos de Defesa e de Sistemas de Defesa no âmbito do Ministério da Defesa (MD).
– PORTARIA MD/ME Nº 4886/2021, que regulamenta a implementação do Relatório Anual de Resultados da Base Industrial de Defesa (RARBID).
– PORTARIA GM-MD Nº 3439/2021, que aprova a Política de Propriedade de Intelectual do Ministério da Defesa.
– PORTARIA GM-MD Nº 3.063, DE 22 DE JULHO DE 2021, que aprova a Política de Ciência, Tecnologia e Inovação de Defesa (PCTID).
– PORTARIA GM-MD N° 3662/2021, que dispõe sobre a Política de Compensação Tecnológica, Industrial e Comercial de Defesa (PCOMTIC DEFESA).
Muito foi feito em pouco tempo, com grande sinergia entre os setores público e privado. Muito ainda resta por fazer, para reverter a total ausência de atenção conferida ao setor nas três décadas anteriores à gestão do Presidente Jair Bolsonaro. As expectativas são, entretanto, promissoras. Dentre os pontos de atenção se encontra, por exemplo, a questão do Fundo de Garantia às Exportações – FGE.
O FGE é fundamental para viabilizar as exportações de produtos de Defesa. Contudo, nos últimos anos, tem apresentado dificuldades em apoiar as exportações brasileiras, em virtude de dificuldades orçamentárias e carências administrativas.
O Governo Federal tem plena ciência de que não se pode conceber soberania efetiva e a busca de autonomia sem produtos de defesa fortes, uma economia de defesa consolidada e uma indústria de defesa autossustentável e avançada tecnologicamente, que possa também funcionar como vetor de exportações, elementos esses, a propósito, prescritos em nossa Estratégia Nacional de Defesa. Por essa razão, aprovou em agosto, ainda em minha gestão à frente da SEPROD, o Decreto 11.169, que institui a Política Nacional da Base Industrial de Defesa.
Trata-se de normativo inédito e inovador, que se destina a orientar a atuação do Poder Executivo no fortalecimento do setor produtivo de bens e serviços de defesa.
Os produtos e serviços desenvolvidos por nossa indústria de defesa, bem como os projetos estratégicos desenvolvidos por nossas Forças Armadas são, e devem ser, motivos de orgulho para nosso País. É nosso dever trabalhar para seguir sempre avançando, pelo bem dos nossos filhos, do nosso futuro, da nossa sociedade e do nosso Brasil.
* Marcos Degaut é Ph.D em Segurança Internacional, Ex-Secretário de Produtos de Defesa do Ministério da Defesa; Ex-Secretário Especial de Assuntos Estratégicos da Presidência da República
O artigo foi publicado originalmente na revista Informe ABIMDE (Dez/2022)
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