Por Talita Zanelato Braga do Carmo*
Com a aprovação da Lei Federal n° 12.846/2013 e de seu Decreto Regulamentador (Decreto n° 8.420/2015), o Brasil passou a tratar de forma mais contundente as regras de Compliance no país, buscando estabelecer diretrizes para condutas permanentes de honestidade, lealdade, transparência, boa-fé e responsabilização, e desta forma, contribuindo para os pilares da Governança Corporativa das empresas privadas que se conectam diretamente com a Administração Pública enquanto fornecedora de produtos e serviços, algo existente a décadas em outros países.
Políticas de Compliance são capazes de alterar o comportamento institucional das empresas, com uma mudança relevante de cultura, mas isto nada significa se não houver um real comprometimento da alta administração da empresa (top of mind commitment) nesta mudança. Neste passo, o Dr. Thomaz Carneiro Drumond destaca que “mais do que comportamento temporário, é uma cultura a ser vivenciada pela empresa, que a encoraje não só a cumprir as normas legais, mas que estimule o alto escalão e os colaboradores a perceberem os benefícios que se originam da prática de tais comportamentos éticos.”
Para empresas maiores de capital aberto, por exemplo, há uma maior tendência de se reconhecer tanto o valor nos processos de controles internos, quanto a credibilidade que o Compliance pode trazer para a reputação da sua empresa no mercado. Este reconhecimento não parece estar tão presente quando nos referimos a empresas de capital fechado e com estruturas societárias mais simples. Vendo esta ausência de comprometimento com programas de integridade definidos pela legislação mãe, os próprios Estados da Federação passaram a criar Leis Estaduais instituindo a obrigatoriedade a programas de integridade, inclusive criando Comissão de Certificação própria do Programa de Integridade, caso a empresa não tenha implementado políticas equivalentes.
Atualmente, a maioria dos Estados possuem medidas de Certificação e Fiscalização dos fornecedores de produtos e serviços em Programas de Integridade e Anticorrupção. Vejam alguns exemplos:
Neste passo, a Nova Lei de Licitações (Lei Federal n° 149.133/2021), recentemente aprovada e em período de transição de sua vigência, acabou por refletir essa série de normas de implantação de Compliance nas empresas privadas, indicando em seus artigos a obrigatoriedade da existência de Programa de Integridade em licitações de grande vulto, sendo esta existência critério inclusive de desempate, a saber:
“Art. 25. O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento. […]
- 4º Nas contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande vulto, o edital deverá prever a obrigatoriedade de implantação de programa de integridade pelo licitante vencedor, no prazo de 6 (seis) meses, contado da celebração do contrato, conforme regulamento que disporá sobre as medidas a serem adotadas, a forma de comprovação e as penalidades pelo seu descumprimento.” (g.n.)
[…]
“Art. 60. Em caso de empate entre duas ou mais propostas, serão utilizados os seguintes critérios de desempate, nesta ordem: […]
IV – desenvolvimento pelo licitante de programa de integridade, conforme orientações dos órgãos de controle.” (g.n.)
Ainda, a mesma Lei se utiliza da existência de Programa de Integridade como item de análise quando da aplicação de eventual sanção ou reabilitação da empresa. Em destaque:
“Art. 156. Serão aplicadas ao responsável pelas infrações administrativas previstas nesta Lei as seguintes sanções:
[…]
- 1º Na aplicação das sanções serão considerados: […]
V – a implantação ou o aperfeiçoamento de programa de integridade, conforme normas e orientações dos órgãos de controle.
[…]
Art. 163. É admitida a reabilitação do licitante ou contratado perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, exigidos, cumulativamente:
Parágrafo único. A sanção pelas infrações previstas nos incisos VIII e XII do caput do art. 155 desta Lei exigirá, como condição de reabilitação do licitante ou contratado, a implantação ou aperfeiçoamento de programa de integridade pelo responsável.” (g.n.)
Com todas essas disposições Estaduais e Federal, sem contar as legislações municipais, fica clara a importância da implantação de Compliance para as empresas diretamente fornecedoras ou prestadoras à Administração Pública, bem como, para os seus parceiros de negócio e fornecedores, “tendo em vista que as pessoas podem escolher regras pessoais para atingimento de metas independentemente do tipo de negócio. Porém, sempre aparecerá alguém oferecendo vantagens para conclusão de certos negócios, pois deve haver um bom controle e processo de monitoramento permanente desses elos de relacionamento com a empresa”, segundo Marcos Assi.
Considerando a multidisciplinariedade de áreas para se criar os Programas de Compliance, Marcos Assi lista as seguintes análises iniciais para que as empresas comecem a avaliar o exercício da função de Compliance:
(i) Emissão de normas, políticas e regulamentos internos.
(ii) Efetuar a pesquisa diária de legislação aplicável às atividades da organização no que se refere à atividade de compliance.
(iii) Realizar teste de eficiência de compliance em operações, procedimentos e cadastros.
(iv) Elaborar teste de aderência de compliance, anualmente, com os gestores responsáveis pelos processos.
(v) Monitoramento e implementação de mecanismos de controles internos vinculados à gestão de compliance.
(vi) Revisão dos processos de controle de pendências cadastrais e documentação referente ao conheça seu cliente – know your customer (KYC), conheça seu fornecedor – know your supplier (KYS) e conheça seu funcionário – know your employee (KYE).
(vii) Criação de controles operacionais e sistêmicos e testes para prevenção e detecção à lavagem de dinheiro, principalmente para organizações com órgãos reguladores na supervisão.
(viii) Proposição e apoio na elaboração de treinamentos diversos, dentro de sua área de atuação e de acordo com as necessidades da empresa e do staff.
(ix) Desenvolver e implementar mecanismos de apoio por meio de relatórios de performance aos executivos da organização para subsidiar decisões no comitê de compliance.
Se a alta gestão não for capaz de responder a esses itens, ponderar é preciso para entender como essa alta gestão poderá ser aprimorada.
* Talita Zanelato Braga do Carmo é advogada atuante na área de Direito Societário e Compliance. Sócia do escritório Zanelato Braga Advogados. Membro do IAPP (International Association of Privacy Professionals)
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