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“São necessários mais investimentos em meteorologia, seja para adensar nossa rede observacional e consequentemente as atividades de monitoramento, seja para aprimorar os modelos meteorológicos para produzir previsões de chuvas com maior resolução espacial e  confiabilidade. São investimentos cruciais que contribuirão para  o monitoramento e alertas, estes essenciais para salvaguardar vidas em todo o território brasileiro.”

A afirmação é da Dra. Regina Célia dos Santos Alvalá, Coordenadora de Relações Institucionais e Diretora Substituta do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), órgão vinculado ao  MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação) e sediado em São José dos Campos (SP).

Formada em Engenharia Cartográfica, com mestrado e doutorado em Meteorologia, Regina é a entrevistada da segunda reportagem da Semana da Meteorologia IACIT. Ela falou sobre os avanços tecnológicos e os desafios enfrentados pelo Cemaden para cumprir sua principal missão: realizar o monitoramento das ameaças naturais em áreas de riscos de municípios brasileiros suscetíveis à ocorrência de inundações, enxurradas, e deslizamentos de terra deflagrados, bem como atualizar os dados de população vivendo em áreas de  riscos de desastres no Brasil.

Por esta razão, o Cemaden é o foco da série da IACIT hoje (23/3), Dia Mundial da Meteorologia, que tem como tema “Alerta Precoce e Ação Antecipada”.  A primeira matéria da série apresentou dados da OMM (Organização Meteorológica Mundial) e os principais marcos da evolução da Meteorologia.

Leia abaixo a entrevista.
 

IACIT: Conte-nos um pouco sobre sua carreira.
Dra. Regina: Sou engenheira cartógrafa, com mestrado e doutorado em Meteorologia, e servidora pública desde 1994. Trabalhei no Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) por 16 anos, como pesquisadora e docente no Programa de Pós-Graduação em Meteorologia. Estou no Cemade desde a sua criação, atuando como pesquisadora e gestora. Atualmente ocupo os cargos de Diretora Substituta e de Coordenadora de Relações Institucionais.

IACIT: Resumidamente, quais são suas principais atribuições no Cemaden?
Dra. Regina: Eu coordeno e participo de diversas parcerias que o Cemaden mantém com instituições como o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ANA (Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico), APAC (Agência Pernambucana de Águas e Clima), e muitas  outras. Com o IBGE, por exemplo, desenvolvemos uma metodologia inédita para mapear e caracterizar a população que vive em áreas de risco de decorrentes de  enxurradas, inundações e deslizamentos de terra. O Cemaden também contribui com vários comitês, entre eles, por exemplo, participo do Comitê Gestor do Programa Garantia-Safra, benefício pago a agricultores em municípios impactados por estiagens e seca na região Semiárida do Brasil. Também sou vice-coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Desastres, e, entre outras atribuições, atendo demandas do MCTI e de outros órgãos e instituições da sociedade.

IACIT: Como a senhora vê o impacto dos avanços tecnológicos na meteorologia ao longo de sua carreira?
Dra. Regina: Quando eu fiz o mestrado lá no início dos anos 80 havia de fato muita limitação tecnológica, seja no contexto de monitoramento das variáveis do clima e dos modelos meteorológicos, seja no contexto de máquinas e ferramentas para processar e analisar grandes volumes de dados. Tínhamos dificuldade até para acessar computadores desktop. Nos últimos 30 anos, houve um grande salto tecnológico, que contribuiu para o avanço das pesquisas, nos permitindo hoje acessar informações rápidas para subsidiar várias atividades, ações e tomadas de decisão.

IACIT:  Quantas áreas de risco e quantas pessoas vulneráveis a risco de desastres naturais são monitoradas atualmente pelo Cemaden?
Dra. Regina: Atualmente o Cemaden monitora continuamente 1038 municípios classificados como vulneráveis a desastres em decorrência de eventos extremos de chuvas (deslizamentos em encostas, desmoronamentos, inundações, enxurradas), para os quais as áreas de risco de desastres estão mapeadas. Quanto ao contingente de população em áreas de riscos, são cerca de 8,3 milhões de pessoas vivendo em cerca de 28 mil áreas de risco, em 825 municípios brasileiros, cujos dados foram estimados com base no último Censo Demográfico do IBGE (2010).

IACIT: Quais são os desafios para monitoramento dessas áreas, como a senhora avalia o cenário nacional atual?
Dra. Regina: As informações meteorológicas são o elemento deflagrador dos desastres que mais impactam o Brasil; portanto, cruciais para subsidiar o monitoramento e alerta de desastres, com maior tempestividade possível. No presente momento não podemos dizer que o país conta com uma rede observacional ideal para o monitoramento de desastres, por isso estamos ainda um pouco longe disso. Certamente há uma demanda por mais equipamentos para monitoramento de mais áreas de risco. Os avanços são sempre necessários, mesmo que difíceis, principalmente no Brasil, país de dimensão continental (território de 8,5 milhões de km²), com grande variabilidade espacial e temporal das chuvas. Gostaríamos de saber qual é essa variabilidade em cada região, e até mesmo na escala intra-municipal. Infelizmente ainda não há como manter uma rede observacional com equipamentos para monitoramento in situ em milhares de áreas de riscos. É nesse contexto que entram, por exemplo, o auxílio dos radares meteorológicos e dos dados satelitários, ainda que seja fundamental contar com equipamentos para calibrar as informações coletadas, e a necessidade de manutenções preventivas e corretivas de muitos equipamentos. Isso demanda recursos orçamentários que possam garantir não apenas uma rede de monitoramento densa, mas também recursos humanos especializados para os centros que recebem esses dados.

IACIT: Os dados meteorológicos utilizados nas análises de monitoramento e prevenção de desastres naturais podem beneficiar outros setores da sociedade?
Dra. Regina: A Meteorologia é uma ciência transversal. O tempo e o clima impactam vários setores, por isso as informações meteorológicas são importantes para subsidiar atividades em vários setores, como por exemplo, aviação, agricultura, pecuária, florestas, meio ambiente… E vai muito além, incluindo também saúde pública. Por exemplo, como as pessoas em diferentes regiões do planeta podem ser mais ou menos impactadas por ondas de calor ou de frio.

IACIT: Considerando o monitoramento de desastres naturais em países como Estados Unidos e Japão, como está o Brasil neste contexto? 
Dra. Regina: Não podemos comparar realidades diferentes, seja no contexto de território seja no contexto de desastres. Os USA têm características diferentes do Brasil e são impactados, por exemplo, por furacões.  Eles contam com centros para monitoramento que envolvem, anualmente, recursos substantivos. Também são impactados por incêndios florestais, ondas de frios e ondas de calor que impactam o país de forma distinta, o que dificulta comparar.
O Japão, país que tem um território equivalente a meio por cento do brasileiro, possui uma rede observacional com muito mais radares meteorológicos do que temos no Brasil. Por outro lado, é um país que pode ser impactado pelas tipologias de desastres que temos aqui e mais um pouco, como enxurradas, deslizamentos de terra, tufões, tsunamis e terremotos.

IACIT: A senhora pode explicar a importância dos radares meteorológicos nas redes de observação e monitoramento? 
Dra. Regina: Informações meteorológicas providas por radares são insumos bastante importantes e relevantes para subsidiar um centro operacional como o Cemaden, principalmente por possibilitar o acompanhamento de sistemas que causam chuvas em áreas mais abrangentes que aqueles providos por instrumentos in situ.   Portanto, informações geradas por radares, combinadas a outras fontes de dados, permitem que o Cemaden se municie de dados que auxiliam na emissão de alertas antecipados para os municípios, com a maior antecedência e tempestividade possível, e aumente a capacidade de prevenção de desastres. Nosso anseio é que os alertas saiam com antecedência mais longa possível, de tal forma que os tomadores de decisão lá na ponta, como a Defesa Civil, tenham condições de salvar o maior número de pessoas no caso da efetividade de ocorrência de um desastre.

IACIT: O Cemaden é uma unidade de pesquisa do MCTI, a senhora pode explicar sobre as atividades do Centro?
Dra. Regina: O Cemaden tem a missão fundamental de monitorar e emitir alertas para municípios prioritários de todo o território nacional da provável ocorrência de desastres associados a fenômenos naturais para os órgãos de Defesa Civil, utilizando tecnologias modernas de monitoramento e previsões hidrometeorológicas e geodinâmicas e antecipando impactos de desastres naturais na sociedade, infraestrutura e ambiente. É também missão do Cemaden promover desenvolvimentos científico e tecnológicos inovadores para avançar na qualidade dos alertas, bem como subsidiar as ações de prevenção e mitigação de desastres. No escopo de formação de recursos humanos especializados, o Programa de Pós-Graduação em Desastres Naturais, estruturado de forma associativa entre o Cemaden e o ICT/UNESP, tem como principal objetivo formar pesquisadores, profissionais e gestores na área de desastres naturais.

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